“Eu amo Trás-os-Montes naquele silêncio das florestas e das estradas afastadas que aguardam ora a neve, ora o pavor do Verão. Amo-o ainda mais quando vejo a cor da terra e a sombra dos seus castelos em ruínas, quando suspeito o fundo dos rios, os recantos junto dos açudes e a altura das árvores. E perco-me desse mal de paixão, quando, de longe, Trás-os-Montes se assemelha vagamente a uma terra prometida aos seus filhos mais distantes, ou mais expulsos, ou mais ignorados, ou mais mortos apenas. E amam-se aquelas árvores porque vêm do interior da terra, justamente, sem invocar a sua antiguidade ou a sua grandiosidade. Ama-se o frio, até, o esplendor das geadas sobre os lameiros, o sabor da comida que nunca perdeu a intensidade nem a razão. E amam-se os rios, os areais, os poços das hortas, as cancelas de madeira que vão perdendo a cor, e talvez se amem o fogo das lareiras, os ramos mais altos dos freixos e das cerejeiras, os jardins abonecados das suas cidades, o granito das casas, o cheiro das aldeias onde ao fim da tarde se chama paz ao silêncio e se dá nome de chuva à água do céu.”
Francisco José Viegas

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Há cerca de um mês, um dos dois moinhos ao torneiro ficara parcialmente transformado num amontoado de pedras na sequência de um incêndio. Foi também local onde viveram uma vida os moleiros, o Ti António e sua saudosa esposa Angélica, que infelizmente já não se encontra entre nós. Em tempos, este casal exerceu o mesmo ofício durante alguns anos nas proximidades da aldeia de Roriz, mas foi nos moinhos ao torneiro que passariam a maior parte das suas vidas na moagem dos cereais. "Aqui me nasceram os dentes e por aqui me caíram"- acrescentou o sr António, numa das minhas inúmeras conversas que eu tive com ele. Antigamente as pessoas que necessitavam da farinha chegavam a formar longas filas de espera para serem atendidas pelo mestre e posteriormente fazer a moagem dos respectivos alqueires de trigo e centeio de cada pessoa que levava! Conta que havia muitos moinhos de água ao longo do ribeiro arcossó até Vila Verde da Raia, mais de quinze, claro que muitos deles eram vestígios de ruínas.
Embora o "Ti António habitasse nos moinhos até fins do ano passado, já não laborava na arte de moleiro há uns anos. É certo que este tipo de moinho não consegue rivalizar com a tecnologia moderna, daí a sua inactividade, mas também as forças já não são as mesmas de outros tempos. Tanto quanto sei, o sr António está por agora aos cuidados da família em Stº António de Monforte, mas não deixa de fazer regularmente a sua visita ao sítio que o viu "nascer", às águas do ribeiro que lhes deu o sustento, onde o som era mais forte nos Invernos rigorosos e às bonitas melodias dos passarinhos que ecoam numa primavera anunciada.
Saudades, quem não as tem ?

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